20 de setembro de 2010

Música em forma de amor na Praça da Liberdade


Não é fácil sair de casa, em pleno sábado chuvoso e um céu acinzentado, para caçar matéria jornalística.

O friozinho inesperado de uma “quase” primavera é um convite irrecusável para uma soneca, mas eu tinha que ir pra rua, precisava achar algo diferente para comentar.

Então parti, rumo ao bairro da Liberdade, no centro de São Paulo. E ainda no metrô, analisando os casais aninhados um ao outro, uma criança correndo divertidamente no corredor daquele imenso vagão, senhorinhas tricotando e mostrando o que de melhor tinham comprado na Rua 25 de Março, conhecida pelas bugigangas baratas, ainda me perguntava o que eu encontraria de diferente para enriquecer uma matéria.

Desembarquei na estação Liberdade “sonada” pelo tempo frio e o cansaço da semana toda e, ainda me perguntava o que encontraria naquela feirinha conhecida por tantas pessoas que mereceria um olhar jornalístico.

Num cantinho escondido daquela praça eu avistei duas pessoas vestidas de forma tão distinta, ele parecia um lorde e ela uma boneca estilo mangá, daqueles desenhos japoneses. Ele, sentado, tocava um instrumento enorme, de uma sonoridade gostosa de ouvir, ela estava em pé e tocava um pequeno objeto de percussão.

E lá fui eu perguntar se eles me dariam alguns minutos de atenção para eu redigir meu trabalho e, com um sorriso singelo daquele rapaz, ouvi: “eu nunca fiz faculdade, mas sempre sou entrevistado por alunos”. Pronto, meu sono desapareceu e minha curiosidade tomou conta da preguiça que me assolava.
.
Nicolau Dreicon tem 18 anos e ganha a vida tocando acordeon, sua namorada, Anne Magalhães, 19 anos, é estudante de Arte Plástica e, aos finais de semana, toca pandeiro.

Ele nasceu em Ibiúna, um município turístico de São Paulo, e está na capital há seis meses. Aprendeu sozinho a tocar alguns instrumentos, mas se identificou com o acordeon, “não se encontra profissionais que ensinam a tocar esse instrumento”, disse sorrindo. Anne nasceu e sempre morou na capital e aprendeu com Nicolau a tocar o pandeiro meia lua.

Era a primeira vez que estavam tocando na praça da Liberdade, sempre ficam na região da Avenida Paulista e da Rua Augusta, também na região central.

Nicolau disse que conseguem um “grana legal”, chegou a ganhar R$ 120 numa noite quando um transeunte lhe pediu para tocar em seu aniversário. E, assim, conheceram pessoas que pediram para tocar em casas noturnas, bares e cabarés.

Mas o que ele gosta mesmo é de tocar na rua, de ver gente. Ele estudou em oficinas de teatro e não conseguiu concluir, mas revelou que ainda o fará.

Agradeci a atenção do casal e pedi para fotografá-los. E ali, no meu último ato, clicando os dois percebi que o amor pairava no ar, parecia que não existia tempo, que não estávamos em uma praça pública. Ela expressava sentimento no olhar fixado nele, ele tocava o acordeon para ela, como se estivesse serenando em agradecimento à sua companheira.

E assim deixei os apaixonados, feliz por ter conseguido registrar aquele retrato e mais ainda por perceber que em todos os lugares encontramos algo diferente, mesmo em dias nublados.